Pablo Neruda

"Isso é tudo. Ao longe alguém canta. Ao longe. A minha alma não se contenta com havê-la perdido. Como para chegá-la a mim o meu olhar procura-a. O meu coração procura-a, ela não está comigo.
A mesma noite que faz branquejar as mesmas árvores. Nós dois, os de então, já não somos os mesmos. Já não a amo, é verdade, mas tanto que a amei. Esta voz buscava o vento para tocar-lhe o ouvido. De outro. Será de outro. Como antes dos meus beijos. A voz, o corpo claro. Os seus olhos infinitos. Já não a amo, é verdade, mas talvez a ame ainda. É tão curto o amor, tão longo o esquecimento. Porque em noites como esta tive-a em meus braços,a minha alma não se contenta por havê-la perdido. Embora seja a última dor que ela me causa,e estes sejam os últimos versos que lhe escrevo." - Pablo Neruda

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Os anos que passaram em um dia



Hoje o dia foi absurdamente longo. Entre as 09:20 e agora (22:40)parece que se passaram meses. Uma lembrança distante da pele que ardia aos 40ºC e do vazio daquele olhar.
Pouco lembro de ter juntado os pertences,ou te ter assinado alguns papeis. O som do oxigênio está bem distante também. Assim como o curativo que tivemos que refazer.
Os gritos de ontem foram substituídos pelo som do seu sorriso. Pelo som que eu recordo do seu sorriso.
E tanta coisa veio à tona novamente.
A laranja cortada em gomos e que eram colocados em fileira decrescente, onde cada gomo era uma neta. Lembrei do frango ensopado que nunca ninguém fez melhor, do gosto da batata assada e também das batatas fritas com alecrim. O molho do macarrão com pedaços de carne. Até a canja de galinha, era a melhor. Possivelmente não seria vegetariana se ela cozinhasse...
Lembrei de dois sapinhos pequenos que tinham um imã cada. Um vermelho o outro azul. Ficavam em uma caixinha de madeira. Aliás, uma vez eu quis criar uma joaninha que peguei no pé de manjericão.A coloquei nessa caixinha, mas ela fugiu! Claro, eu havia deixado a caixa um pouco aberta para ela respirar!
Lembrei da Filomena, do Ciccio e do enterro desse passarinho que viveu mais de 20 anos (dizem que viveu mais de 30 anos e foi passado de geração em geração).
A lata de botões.Os azuis eram os meus preferidos.
Eu lembro dessa casa como era há 20 anos. A penteadeira com o perfume em forma de sino de um azul absurdamente maravilhoso.
Da Nossa Senhora de Fátima de tocava uma musiquinha ao darmos corda.
Da saída do colégio e do cheiro de dama da noite.
Tudo muda, mas existem coisas que ficam para sempre.
Os marzipans jamais serão os mesmos.
Nem os coelhinhos de chocolate na Páscoa.
E os papais-noel no Natal.
A Rua Batata Ribeiro...quem poderá esquecer? Nunca estive lá fisicamente, mas na imaginação sim. Quando ela contava histórias de lá.
Tantas outras coisas que só possuem significado por alguém ter existido e ter dado significado a tudo.
É nisso que vou pensar agora. Chorarei tudo que tiver que chorar, mas sei que estes últimos anos ficarão perdidos no tempo e serão substituídos pelo cheiro da torta de acelga com rolinhos de massa em cima, pelo pão de ló com goiabada e pelo esmalte pink, do mesmo tom que estão minhas unhas hoje.

Descansa vó.

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