Pablo Neruda

"Isso é tudo. Ao longe alguém canta. Ao longe. A minha alma não se contenta com havê-la perdido. Como para chegá-la a mim o meu olhar procura-a. O meu coração procura-a, ela não está comigo.
A mesma noite que faz branquejar as mesmas árvores. Nós dois, os de então, já não somos os mesmos. Já não a amo, é verdade, mas tanto que a amei. Esta voz buscava o vento para tocar-lhe o ouvido. De outro. Será de outro. Como antes dos meus beijos. A voz, o corpo claro. Os seus olhos infinitos. Já não a amo, é verdade, mas talvez a ame ainda. É tão curto o amor, tão longo o esquecimento. Porque em noites como esta tive-a em meus braços,a minha alma não se contenta por havê-la perdido. Embora seja a última dor que ela me causa,e estes sejam os últimos versos que lhe escrevo." - Pablo Neruda

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Garotas-seta

(Publicado no site do Sunny em 07/09/2011 www.incomodese.com)

 Estão por toda parte, principalmente aos finais de semana. Nos cruzamentos mais movimentados e no meio de grandes quarteirões. Chamando atenção para feirões de carros ou para os novos empreendimentos imobiliários que se alastram pela cidade. Debaixo do sol forte, passam horas embalando a grande seta com o nome do evento/futuro lançamento pendurada no pescoço. As garotas seta sofrem. Faça chuva, sol, ou tempestade, lá estão elas a trabalhar. Horas e horas em pé, embalando, embalando.
Essa é a publicidade que o cliente da agência de propaganda quer ver. Além dos panfletos nos semáforos, que acreditava serem proibidos, as grandes setas apontam o caminho do bom negócio. Carro novo? Siga a seta! Apartamento de 1, 2, 3, 4 dormitórios? Siga a seta! Precisa de sala para sua empresa? Ah! Adivinha? Siga a seta!
Seus problemas acabam quando descobrir o tesouro de oportunidades escondido no final do caminho de setas! Prazos, brindes, pagamentos a perder de vista. E elas continuam embalando o adereço pendurado sobre os ombros, com o tédio estampado no rosto. É difícil ganhar dinheiro nesta vida.
O mesmo não se pode dizer das empresas que alugam espaço para que ocorram eventos como os tais feirões. O contratante, no caso as agências, são tratadas como escravas dessas poderosas empresas, que oferecem seus serviços como se estivessem fazendo um favor sem ter a mínima vontade. Criam contratos surreais, onde em caso de prejuízo, mesmo que causado por um funcionário da empresa grande, quem arcará com o infortúnio será o cliente. E as agências assinam assassinando o direito de seus próprios funcionários de terem um emprego sadio. Repassam aos seus o que as grandes donas do mercado lhe fazem. Esperteza dos homens de negócio.
A pirâmide do poder de cada empresa. Todas iguais. O topo ganha dinheiro e muito, às custas do trabalho pesado de tantos gerentes de atendimento que são obrigados a se fingir de tontos para manter seus empregos. Mercado da exploração? Talvez. O fato é que quem pode mais chora menos e viaja mais. Não viaja de trem, nem faz baldeação na Sé. Vai pra Cancun esperar o dia da tão sonhada aposentadoria!
A garota da seta está lá, pensando que conta pagar com o dinheiro daquele dia trabalhado. Suando muito, desanimada, mas não pode desistir. O gerente de atendimento vai trabalhar para pagar o calote que sua empresa tomou da grande empresa que cede espaço, enquanto o ladrão de verdade está gastando o que roubou escondido em alguma cidade distante. Os chefes do gerente calculam quantos meses faltam para a tão sonhada aposentadoria. Os donos do espaço do evento? Estão brincando de distribuir setas para garotas, lucrando cada dia mais com seus contratos nada amigáveis e com o trabalho árduo de seus clientes. E funcionários, e fornecedores, e agentes de viagem, e...

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